06/10/2017 14h20

Promovida pela vereadora Fernanda Garcia (PSOL), que considera o “gritante” o reajuste da Planta de Valores, podendo chegar a 1.311% na Avenida Paraná, o evento contou com a participação de especialistas em direito tributário e representantes de associações de moradores

 

O aumento da Planta Genérica de Valores do Município e seu impacto no IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) para os próximos anos foram tema de audiência pública realizada na noite de quinta-feira, 5, no plenário da Câmara Municipal. A iniciativa foi da vereadora Fernanda Garcia (PSOL), com a participação dos seguintes expositores: o vice-presidente da OAB-Sorocaba, Márcio Leme; o advogado tributarista Marcelo Maximilian Kaiber, de São Paulo, mestrando em Direito Tributário pela FGV; e a professora de Direito Tributário da Esamc, Cláudia Marchetti da Silva. Também compuseram a mesa principal o vereador Hélio Brasileiro (PMDB) e o presidente do PSOL, Igor Tanaka.

 

Fernanda Garcia abriu os trabalhos lembrando que “o país vive um momento de crise econômica e desemprego, que ocasiona uma perda no poder aquisitivo das pessoas, e não é o momento para se aumentar impostos”. A vereadora também criticou a falta de debate acerca do Projeto de Lei nº 247/2017, de autoria do Executivo, que resultou na Lei 11.593, de 29 de setembro de 2017, que atualiza a Planta Genérica de Valores (por metro quadrado). A exemplo dos demais participantes da audiência, a vereadora defendeu que um projeto dessa magnitude, que tem impacto direto no bolso do contribuinte, precisa ser melhor debatido com a sociedade em audiências públicas, o que, como enfatizou, não ocorreu.

 

Capacidade contributiva – O advogado tributarista Marcelo Maximilian Kaiber fez uma exposição detalhada sobre a Lei 11.592, que estipulou o reajuste do IPTU para 2018, e a Lei 11.593, que atualizou a Planta Genérica de Valores. “Na questão tributária, não podemos nos ater apenas aos aspectos formais da lei e da conveniência da administração, mas também é preciso estar atento para a situação econômica e a capacidade contributiva do cidadão”, afirmou, lembrando que esse preceito está no parágrafo 1º do artigo 145 da Constituição de 88 e tem sido levado em conta pela jurisprudência, inclusive em decisões do Supremo. O tributarista observou que a falta de debate com a sociedade, sem uma clareza acerca dos critérios que nortearam a atualização da planta de valores, gera insegurança jurídica, algo que, segundo ele, vem ocorrendo inclusive no plano federal.

 

“Na minha opinião, foi cumprido o requisito formal na aprovação das referidas leis. Mas, pelo que vi do texto da lei, não sabemos qual o critério para atualização da Planta Genérica de Valores. Temos diversas decisões do TCE de São Paulo sobre a importância da acurácia de quem faz essa planta. Como o contribuinte terá certeza de que o valor disposto foi encontrado através de um critério técnico? Pode haver uma corrida ao Judiciário de diversos contribuintes, contestando os novos valores da Planta Genérica, o que tende a aumentar o contencioso jurídico, acarretando mais custos para o município”, afirmou.

 

Tramitação célere – O advogado Márcio Leme, vice-presidente da OAB, também criticou a celeridade na tramitação e aprovação dos projetos que resultaram nas leis sobre a Planta de Valores e o IPTU e questionou o que considera uma contradição no discurso do Executivo ao dizer que não houve aumento de IPTU, mas apenas correção: “Como explicar aos servidores que, para majorar o IPTU, o Executivo e seus representantes na Câmara sustentam que a correção monetária não é reajuste, mas quando é para beneficiar o servidor, o empregado, aí, sim, é reajuste?”. Também criticou a imprensa por não ter dado a devida repercussão à majoração do IPTU. “Não tenho dúvida que, a partir de fevereiro do ano que vem, a parcela mais carente da população vai sentir, como ninguém, a majoração do IPTU, que, em algumas situações, poderá chegar a 300%”, salientou, acrescentando, ainda, que, do ponto de vista jurídico, não ficaram claros os métodos utilizados para a correção da planta genérica, o que, no seu entender, “pode acarretar uma cilada: o que o município vai arrecadar com a majoração de impostos, ele vai perder com os custos jurídicos das ações que tende a sofrer”.

 

A professora Cláudia Marchetti da Silva afirmou que os tributos são fundamentais para a sociedade, mas disse que é preciso estabelecer critérios claros para sua cobrança, o que, no seu entender, não ocorreu no caso do IPTU. Segundo ela, quando o valor venal não reflete o valor de mercado, isso pode gerar questionamentos, como tem acontecido em relação ao ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação), que é de competência do Estado. “A procuradoria do Estado contesta frequentemente o valor venal e solicita um perito para do Creci para reavaliar o imóvel e atualizar o valor do ITCMD. Não ter um valor venal atualizado pode levar a uma judicialização da base de cálculo”, ressalvando, entretanto, que essa atualização precisa ser feita com critérios transparentes. A professora acredita que a atualização da planta de valores pode acarretar um aumento maior de IPTU nas áreas mais carentes do que nas áreas nobres.

 

Também o vereador Hélio Brasileiro (PMDB) – que votou contra o reajuste da Planta de Valores – criticou a falta de debate dessas questões e parabenizou a vereadora Fernanda Garcia pela realização da audiência. “Desde o primeiro, eu disse que esse não é o momento oportuno para ter aumento de imposto. Por isso, faz todo sentido realizar essa audiência pública, mesmo depois de promulgada a lei”, defendeu. O vereador também disse que irá apresentar um requerimento solicitando ao Executivo informações sobre as desapropriações em curso, que também serão impactadas pela atualização da Planta de Valores.

 

“Reajuste gritante” – A vereadora Fernanda Garcia apresentou uma planilha com os percentuais de reajuste da Planta Genérica de Valores, elaborada por seu gabinete. Na Avenida Paraná (Cajuru), o reajuste pode chegar a 1.311%, saindo de R$ 42,51 o metro quadrado para R$ 600,00. Na Avenida Três de Março, o valor do metro quadrado passará de R$ 75,27 para R$ 600,00, um aumento de 910%. Na Avenida Independência, o metro quadrado passará de R$ 42,51 para R$ 250,00, ou 448% de reajuste. Já na Avenida Dom Aguirre, na Zona Leste, o metro quadrado passará de R$ 115,00 para R$500,00, ou 332% de reajuste. “O aumento é gritante, assustador, e vai incidir no IPTU”, afirmou a vereadora, enquanto Claudia Marchetti chamou a atenção para os reajustes maiores nas áreas carentes.

 

O advogado Marcio Leme observou que, para o ano que vem, o reajuste do IPTU terá como base os valores de 2017, aplicando-se apenas a correção monetária, sem o impacto da atualização da Planta de Valores, como prevê a Lei 11.592, mas, para 2019, se não for mudada a lei, vão prevalecer os altos reajustes de valores, como os levantados pelo gabinete da vereadora. O presidente do PSOL, Igor Tanaka, também criticou a falta de debate com a sociedade. E a vereadora Fernanda Garcia, finalizando a audiência, enfatizou a importância de se debater o assunto e disse que encaminhou um requerimento à Prefeitura cobrando informações sobre os critérios para o cálculo dessa Planta Genérica de Valores para 2019.

 

A audiência pública, que contou com participação de representantes de associações de moradores, não teve a presença do secretário da Fazenda, Fábio de Castro Martins, devido à volta de José Crespo (DEM) à Prefeitura, em lugar de Jaqueline Coutinho, por determinação da Justiça, no final da tarde de quinta-feira. Os trabalhos foram transmitidos ao vivo pela TV Câmara (Canal 61.3, digital e aberto, e Canal 6 da NET).