Em audiência pública promovida pelo vereador Luis Santos (Pros), autor do projeto de lei, diversos participantes enfatizaram a existência de doutrinação ideológica nas escolas
O Projeto de Lei 222/2017, de autoria do vereador Luis Santos (Pros), que institui no âmbito do sistema municipal de ensino, o “Programa Escola sem Partido”, foi objeto de audiência pública realizada na noite de segunda-feira, 9, no plenário da Câmara Municipal de Sorocaba, com a participação de pais, alunos e professores, que lotaram a galeria da Casa. O projeto de lei tem como objetivo combater a doutrinação ideológica no ensino e foi idealizado pelo movimento “Escola Sem Partido”, de âmbito nacional, fundado em 2004 pelo procurador Miguel Nagib.
A mesa dos trabalhos foi composta pelas seguintes autoridades: Davi Vieira, representante municipal do Programa Escola Sem Partido; Steh Papaiano, representante nacional do Escola Sem Partido; Ted Martins, do Movimento São Paulo Conservador; e o advogado Ricardo Augusto Santos, representando a OAB Sorocaba. No início da audiência, foi feito um minuto de silêncio, proposto pelo vereador, em memória das vítimas do incêndio na creche da cidade mineira de Janaúba, e, no final da audiência, Luis Santos reiterou a importância do papel do professor e pediu manifestação de aplausos aos presentes pelo Dia do Professor, que será comemorado no próximo dia 15 de outubro.
O fundador e coordenador do Movimento Escola Sem Partido, Miguel Nagib, enviou um vídeo, especialmente produzido para a audiência, que foi apresentado no início dos trabalhos. Segundo Nagib, o Programa Escola Sem Partido se alicerça na Constituição Federal e na Convenção Americana sobre Direitos Humanos. “Nosso projeto não cria para o professor nenhum dever que já não existia, apenas explicita esses deveres dentro da sala de aula para que o estudante conheça seu direito”, afirmou no vídeo.
OAB e movimento – O representante da OAB, Ricardo Augustus Santos, apresentou um parecer contrário ao projeto de lei, que, segundo a entidade, é inconstitucional. “Nossa análise é uma nota técnica e não adentramos no mérito da questão. A OAB, em conjunto com as Comissões da Diversidade Sexual e de Gênero, Direitos Humanos, Direitos Infanto-Juvenis e OAB Vai à Escola, entende que o referido projeto é inconstitucional sob os aspectos formal e material, ferindo 18 dispositivos da Constituição Federal. A competência para legislar sobre diretrizes nacionais de educação é privativa da União, não podendo Estados e Municípios legislarem acerca do tema”, afirmou, adiantando que, se o projeto for aprovado, a OAB será uma das primeiras entidades a propor ação declaratória de inconstitucionalidade contra o projeto.
A representante nacional do Escola Sem Partido, Steh Papaiano, também estudante de Direito, contestou o parecer da OAB, lembrando que a Constituição, em seu artigo 211, parágrafo 2º, prevê que os municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil. Papaiano também defendeu o projeto com base em diversos outros dispositivos constitucionais, entre eles, o artigo 5º da Constituição. “A OAB até agora não se manifestou sobre as escolas que estão ministrando a ideologia de gênero, mesmo ela tendo sido negada nos âmbitos municipais, estaduais e federal”, ressaltou, apontando o que considera uma contradição no posicionamento da entidade.
Davi Vieira, do Escola Sem Partido Municipal, afirmou: “A exemplo da maioria das pessoas presentes, sou contra uma escola com censura, uma escola sem conhecimento, uma escola sem debate político. Justamente por isso buscamos apoio do vereador Luis Santos (Pros) para apresentar o projeto do Escola Sem Partido. Há comprovação da doutrinação ideológica nas escolas. O Escola Sem Partido não cria deveres, esses deveres decorrem da legislação. Ele não prevê censura, nem veta o debate político ou a opinião pessoal do professor em sala de aula. Caso perguntado por um aluno, o professor pode dizer, por exemplo, que o impeachment se trata de um golpe, mas precisa deixar claro que essa é sua opinião e não a opinião oficial do Estado brasileiro”, explicou, acrescentando que a doutrinação ideológica nas escolas não é uma questão imaginária, mas um problema real.
Ted Martins, do Movimento São Paulo Conservador, criticando o representante da OAB, que havia criticado a realização da audiência pública, indignou-se: “Calar a Casa do Povo é o sonho de todo comunista, como acontece na Venezuela. Esta Casa não se calará, caso contrário, o Brasil corre o risco de ver implantado o totalitarismo, não apenas político, mas das próprias consciências. O Escola Sem Partido vem para tratar a verdadeira conscientização, não a conscientização de um lado só, que considera arte uma criança tocar um homem nu. Ele vem para garantir a liberdade para que as pessoas possam pensar. O sistema educacional brasileiro está falido: ele ensina crianças de dez anos a descerem até o chão dançando funk; ensina falar palavrão; ensina o aborto; ensina todo tipo de porcaria, como a ideologia de gênero. Por isso, em 2014, mais de 500 mil estudantes do Enem zeraram na prova de redação”.
Apoio dos presentes – O suplente de vereador JP Miranda (PSDB) fez questão de enfatizar seu apoio ao projeto, posição que já havia externado em plenário quando no exercício do mandato de vereador. E também criticou a Apeoesp (o Sindicato dos Professores): “A Apeoesp vem se posicionando contrariamente ao projeto. Escreve que o projeto propõe uma escola sem conhecimento e reflexão. Quem não tem conhecimento são eles, que querem doutrinar as nossas crianças. Essa minoria de professores comete assédio nas salas de aulas e apoia criança manipulando um homem nu com dinheiro da Lei Rouanet e colocação de uma genitália num prédio histórico da cidade. Sorocaba vai mandar o seu recado como fez Jundiaí e Campinas, que consideram o projeto constitucional. Essa Casa é a Casa do Povo e o povo tem o direito de vir aqui e dizer que ele não concorda com essa pouca vergonha na sala de aula” – indignou-se.
O professor Francisco Razzo, mestre em Filosofia, coordenador pedagógico do Colégio Anglo e autor do livro A Imaginação Totalitária (Editora Record, 2016), lembrou que acompanha o movimento desde seu embrião e disse que tem críticas pontuais ao projeto, mas ressaltou sua importância: “É quase redundante falar em escola sem partido. O conceito de escola, na sua origem socrática, incorpora o conceito de tempo livre para uma instituição que discute ideias e já traz em si o conceito de liberdade. Não há escola sem reflexão”. Razzo enfatizou ainda o papel da família no ensino, que tem sido inibido pela onipresença do Estado: “A prerrogativa da educação é familiar, não existe papel mais importante na educação das gerações do que a família. Aqueles que, de alguma forma, são contra o Escola Sem Partido, são contra com o objetivo de aumentar o poder o Estado, diluindo o indivíduo e a família no poder estatal. O Escola Sem Partido despertou o interesse da sociedade civil para acompanhar o que o filho está aprendendo na escola e, nesse ponto, já é vitorioso. Por isso, uma das críticas que faço é no sentido de que não precisamos usar o poder coercitivo do Estado nessa questão”.
Ricardo Sabanai, presidente do Conseg Norte, disse que as crianças saem da escola analfabetas e não é necessário levar para a sala de aula assuntos polêmicos, que disseminam o ódio, como faz a esquerda: “Desse jeito, não vamos criar intelectuais politizados, vamos criar analfabetos politizados. Existe a revolta, até um ódio de ambos os lados, porque vamos levar isso para as nossas crianças? Eles não precisam participar dessas coisas. Há cerca de dois anos, numa escola da cidade, havia uma exposição de cartazes em que os policiais militares apareciam como o mal da sociedade enquanto o PCC era apresentado como uma entidade que queria humanizar os presídios do país. Que futuro tem um aluno do ensino médio fazendo esse tipo de trabalho? Vamos melhorar a educação e parar com esse negócio de levar política, levar ódio para dentro da escola”.
Crítica à OAB – Rodrigo Neves, professor de história, gestor de políticas públicas e especialista em Direito Constitucional, fez críticas à OAB devido à nota técnica apresentada pela entidade: “A OAB ignorou a jurisprudência de vários municípios que consideraram o projeto constitucional e preceitos básicos do direito, como a concorrência competente da União, dos Estados e Municípios em relação à educação. O artigo 24 da Constituição também prevê que a União, os Estados e os Municípios são competentes para legislar sobre a proteção à infância e juventude, que é o que o propõe o projeto. Por fim, a OAB ignora os tratados internacionais ratificados pelas duas Casas do Parlamento brasileiro”. Neves disse que sua intenção era falar sobre a doutrinação ideológica nas escolas, que testemunhou como professor, mas o parecer da OAB o fez mudar o teor de sua fala. Mesmo assim, disse ter visto, nas escolas, “aberrações como professores de geografia falando de política em aula de climatologia e professores de matemática falando da matemática do golpe”.
O representante do MBL (Movimento Brasil Livre), Paulo Fabiano Veríssimo Braga, afirmou que “o MBL prima pela defesa das liberdades individuais e o Escola Sem Partido é fundamental na defesa dessas liberdades”. “Eu sofri doutrinação de esquerda e não quero que minha filha de seis anos sofra o mesmo”, afirmou. Já Patrícia Bueno, do Movimento Endireita Brasil, contou que foi professora universitária, mas que, ao se tornar militante política, decidiu deixar a sala de aula por entender que não era justo continuar sendo professora. “Escola Sem Partido defende liberdade, pluralismo e proteção às crianças. Quem pode ser contra isso?” – argumentou.
O advogado Lucas Gandolf criticou o parecer jurídico da OAB: “O projeto de lei preserva o pluralismo de ideias no âmbito acadêmico, visa assegurar a liberdade de aprendizado e consciência e não interfere na liberdade de cátedra dos professores. Não restringe o direito de qualquer conteúdo, pelo contrário, amplia esse conteúdo. O município pode legislar, de forma suplementar, sobre o ensino”. Ítalo Moreira, líder comunitário da Zona Norte, também citou o caso do professor que fazia apologia ao PCC e atacava a polícia, induzindo seus alunos a fazerem trabalho nesse sentido. Elias Magurno, do Observatório Brasil em Sorocaba, disse que o projeto defende a educação para a cidadania. Márcio Graziano, do Vem Pra Rua Sorocaba, disse ter vergonha do posicionamento da OAB.
Edilson Júnior, da Juventude do PSDB, disse que, como estudante do ensino médio, foi impedido de estudar por invasores de escolas, que são os mesmos que hoje se opõem ao Escola Sem Partido. Juan Carvajal, estudante do ensino médio em escola particular, disse que cerca de 70% dos professores de sua escola são filiados ao Partido Comunista do Brasil e falam mal do Escola Sem Partido todos os dias. Maria Helena, mãe de aluna de escola particular, também disse que tem muito professor doutrinando na escola de sua filha e afirmou que “a esquerda aparelhou a educação com o objetivo de desconstruir sociedade”. Glauber, pai de aluno, também criticou a OAB. Já Rômulo Freire, do PSDB Sorocaba, apresentou alguns questionamentos ao projeto de lei e defendeu o respeito às individualidades.
Mais manifestações – Outras pessoas presentes na audiência pública também se manifestaram em apoio ao Escola Sem Partido, enquanto Lucas, professor da rede estadual e estudante de história, criticou o projeto e disse que certos alunos e pais estão perseguindo professores onde o projeto foi aprovado. Já o estudante Robson Pedroso, da Diversidade Tucana, criticou o termo “ideologia de gênero”, que aparece no projeto, afirmando que o correto seria identidade de gênero. “Esse artigo cria preconceito contra o transgênero”, afirmou. Alípio Napal disse que não pode haver doutrinação nem de um lado nem de outro. Já uma mãe de uma escola da rede estadual de ensino afirmou ter perdido sua filha, de 15 anos, para os ideólogos de esquerda, uma vez que a menina saiu de casa.
Luciana Stanzioni, representante dos pais de alunos, disse que, se os pais não ficarem atentos, “serão devorados por essas ideologias que estão transtornando a cabeça de nossas crianças”. Auxiliar de educação, ela disse ter compromisso com ao pais das crianças que são colocadas sob seus cuidados, para dar continuidade à educação que eles recebem em casa. “Muitos professores são oprimidos pelo politicamente correto, mas, graças a Deus, temos muito bons professores. Infelizmente, uma minoria está no comando de tudo. Só não está pior porque as boas professoras, que são à maioria, estão resistindo”, afirmou.
“Doutrinação em sala” – No final dos trabalhos, o vereador Luis Santos fez um pronunciamento em favor do Escola Sem Partido, citando o filósofo francês Olivier Reboul, que morreu em 1992 aos 67 anos, e é autor de clássicos da filosofia da educação. O referido autor enumera 13 casos de doutrinação que costumam ocorrer nas escolas, dos quais, o vereador elencou cinco, que, segundo ele, são estão presentes na educação brasileira: 1º) utilizar o ensino para veicular propaganda partidária; 2º) ensinar com base em uma doutrina como se fosse a única possível; 3º) ensinar como científico aquilo que não é; 4º) falsificar fatos favoráveis à sua doutrina; e 5º) propagar o ódio por meio do ensino.
Luis Santos também citou o cientista Steven Pinker, autor do livro Tábula Rasa, professor de Harvard e um dos mais renomados pesquisadores da neurociência, que condena a tentativa de se negar a natureza humana no meio acadêmico. “A negação da natureza humana – diz Pinker, citado pelo vereador – provocou uma desconexão entre a vida intelectual e o bom senso e não apenas corrompeu o mundo dos críticos e intelectuais, como também prejudicou a vida de pessoas reais”. Pinker cita como exemplo a tentativa de se “eliminar o jeito de ser dos meninos, forçando as crianças a participarem de atividades atípicas de seu sexo” e chegando a “suspender meninos que correm durante o recreio ou brincam de polícia e ladrão”.
“Ou seja, a ideologia de gênero, além de totalitária, é anticientífica, mas vem sendo imposta nas escolas como verdade inquestionável, e o aluno indefeso é tratado como massa de modelar nas mãos dos pretensos engenheiros sociais. Mas não só os alunos são vítimas – também os professores são prejudicados por esse processo de doutrinação” – afirmou Luis Santos (Pros), acrescentando que as universidades “estão sitiadas por ideólogos de esquerda, que escrevem os livros didáticos, pautam as redações dos jornais e determinam as diretrizes curriculares do MEC, obrigando o próprio professor a pensar como eles”. Para o vereador, o Escola Sem Partido “é contra a camisa de força ideológica”.
A mesa estendida contou com os seguintes participantes, além dos citados: Marcius Augustus Pereira, da Igreja Presbiteriana Filadélfia; Ana Claudia, representante municipal do Escola Sem Partido; Jorge Alvarenga, diretor de Assuntos Comunitários do Conseg Sul; Fernando Ataíde, advogado; Roseli Bonora, do Observatório Social do Brasil em Sorocaba; Edilson Júnior, da Juventude do PSDB; Edson Vergílio, representando o Conseg Sul; Pedro Brito, membro da Diversidade Tucana; Douglas Garcia; Genésio Albuquerque; Jacseli Moreno; e Sebastião Albuquerque, assessor da vereadora Iara Bernardi (PT).