Conduzida pela vereadora Iara Bernardi (PT), audiência foi marcada por críticas ao projeto de gestão compartilhada que está em elaboração pela Prefeitura
Com o objetivo de discutir vários problemas da Educação Básica e do Ensino Fundamental do Município de Sorocaba, especialmente a terceirização de escolas, a Câmara Municipal realizou audiência pública na noite de terça-feira, 7 de março, com a presença de várias autoridades pedagógicas. A iniciativa da audiência foi da vereadora Iara Bernardi (PT), que ressaltou a necessidade de se discutir o modelo de gestão da educação básica, sobretudo a proposta de se entregar a gestão das escolas para organizações sociais, bem como a jornada de trabalho dos professores.
A mesa de trabalho da audiência pública foi composta pelas seguintes autoridades, além da proponente: secretária municipal de Educação, Marta Cassar; presidente do Sindicato dos Servidores Municipais, Salatiel Hergesel; Fátima Farias, diretora estadual da Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo); professora Abigail Camargo, representante da Comissão de Auxiliares de Educação; e a presidente da Aspams (Associação dos Professores da Rede Municipal de Ensino de Sorocaba), Vânia Nascimento. O vereador José Francisco Martinez (PSDB), membro da Comissão de Educação da Casa, e a vereadora Fernanda Garcia (PSOL), também participaram da audiência.
A terceirização da educação foi um dos principais temas da audiência pública. A Prefeitura pretende compartilhar a gestão de 28 escolas municipais com organizações sociais, alegando falta de recursos e os limites da Lei de Responsabilidade Fiscal. “Segundo o secretário da Fazenda, Marcelo Regalado, a Prefeitura gasta com a folha 43,7% do orçamento. A Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece em 54% o limite de gasto com a folha. Mas a Prefeitura não chegou nem ao limite de alerta, que é 48,6%”, afirmou Iara Bernardi, observando que o piso do professor da rede municipal de ensino é de R$ 4.236,00, mais os incentivos funcionais, como aprimoramento acadêmico, por meio da pós-graduação, enquanto nas escolas terceirizadas o piso será o da rede particular de ensino, que é de R$ 1.196,60, mais 5% por hora-atividade. “E sem qualquer incentivo para a evolução intelectual do docente”, observou.
Precarização das escolas: A vereadora também leu documento com o diagnóstico dos problemas de várias unidades de ensino, constatadas por ela em visitas presenciais nas escolas. A Escola Osório de Campos Maia, no Jardim Capitão, está funcionando com 10 professores eventuais. A CEI 79 “Prof. João Tortello”, no Jardim Botucatu, precisa de mais 18 auxiliares, pois a escola registrou 81 matrículas por ordem judicial em 2016 e mais 42 em 2017. Na CEI-107 “Profa. Arminda da Silva Telo”, no Horto Florestal, faltam 16 funcionários. Na CEI 81 “Profª Edith Del Cistia”, no Parque São Bento, há falta de auxiliares e salas superlotadas. Também faltam profissionais nas seguintes escolas: CEI 87 “Dr. Cássio Rosa” (Habiteto); CEI 88 “Profª Vera Guariglia” (Jardim Morada do Sol); CEI 59 “Eugênio Leite” (Brigadeiro Tobias); CEI 104 “Prefeito José Crespo Gonzales” (Morada das Flores); e CEI 114 “Fausto Ferreira Teles” (Jardim Bonsucesso).
Com base nesse diagnóstico, Iara Bernardi irá sugerir ao Ministério Público (para um possível Termo de Ajuste de Conduta) a o chamamento de aprovados no último concurso e também o aumento de vagas de creches com as entidades já conveniadas com o município, sem terceirizar nenhuma escola municipal. “Proponho que a promotoria firme um TAC com o município para que haja construção e ampliação das unidades escolares no município, evitando que a terceirização se torne prática corrente”, afirma. Iara Bernardi também quer que a promotoria fiscalize a questão dos estagiários, enfatizando que eles não podem ficar sozinhos com as crianças, sem acompanhamento de um professor e questionou, ainda, a capacidade da Prefeitura de fiscalizar as escolas que serão terceirizadas.
Melhores condições profissionais: O vereador José Francisco Martinez (PSDB) também reivindicou o chamamento de professores e auxiliares de educação aprovados no último concurso, defendeu a inclusão dos auxiliares de educação na carreira do magistério e, reverberando uma reivindicação que ganhou corpo na Câmara Municipal, sobretudo através de projeto de lei do vereador Vitão do Cachorrão (MDB), também solicitou que os professores da rede municipal, especialmente os que trabalham em bairros distantes, tenham o direito de se alimentarem na escola. A secretaria reconheceu a importância pedagógica de oferecer merenda aos professores, especialmente nas creches, e se comprometeu a discutir o assunto.
Em sua fala inicial, a secretária Marta Cassar disse que, no final de 2017, a fila de espera nas escolas municipais era de 4.500 crianças e, hoje, é de cerca de 2.300. Contou também que a secretaria apresentou um plano de trabalho para a promotora Cristina Palma, que prevê a construção de sete creches, até o final do governo, com recursos próprios. Elas serão construídas nos bairros Jardim Santa Isabel, Jardim São Mateus, Wanel Ville V, Jardim Nilton Torres, Vila Amato (na região de Aparecidinha), Jardim Eliana e Vila Santa Clara. A Prefeitura de Sorocaba também dispõe de recurso de R$ 15 milhões do Ministério das Cidades, que serão destinados à construção de três creches e duas escolas. Com relação às escolas visitadas por Iara Bernardi e que estão com falta de auxiliares, elas terão funcionários celetistas, segundo a secretaria. “Se a Secretaria da Fazenda autorizar, vamos chamar servidores do concurso”, disse.
Projeto de terceirização: Marta Cassar disse que o estudo jurídico com a finalidade de terceirizar o ensino ainda está em processo de elaboração e, caso a proposta seja juridicamente possível, será elaborado um “Termo de Referência”, à luz da legislação federal, estadual e municipal, inclusive da Lei Federal 13.019, de 31 de julho de 2014, a chamada “Lei do Terceiro Setor”, e esse documento será submetido ao Conselho Municipal de Educação e, posteriormente, discutido com a Câmara Municipal. “Caso essa parceria com as organizações sociais não seja possível, a secretaria tem um ‘Plano B’, que seria o plano da vereadora Iara no sentido de aumentar o número de vagas nas entidades com as quais já temos convênio”, adiantou a secretária.
Marta Cassar frisou, ainda, que a gestão compartilhada com as organizações sociais irá valer apenas para escolas novas, as demais permanecem geridas pelo município com quadro de servidores efetivos. Também disse que vem lutando por reposição dos quadros de professores, mas que isso depende também da Secretaria da Fazenda. “Estamos propondo as organizações sociais para gerir as novas escolas e não para as existentes. O impacto financeiro para a equipe dessas escolas novas seria de R$ 48,5 milhões, caso fossem servidores efetivos. Esse valor passaria dos 53% da Lei de Responsabilidade Fiscal. Por isso precisamos de planejamento, caso contrário, a própria Prefeitura não sobrevive, entra em colapso”, alertou a secretaria.
A vereadora Fernanda Garcia cobrou valorização dos professores e auxiliares, afirmando que a cidade tem o nono maior PIB do estado de São Paulo. “Nosso orçamento é alto, nossa cidade é rica, mas toda vez que discutimos a realização de concurso público para a Educação, eles esbarram na lei de responsabilidade fiscal, no limite prudencial. Só que quando vem o Secretário da Fazenda prestar contas, ele afirma que haveria possibilidade de contratação”, argumentou a vereadora, cobrando a convocação de profissionais concursados. “Já deveria ter sido feito o chamamento do concurso público. Por que não foi feito?”, questionou.
Marta Cassar respondeu que a Secretaria de Educação faz o papel dela que é solicitar à Secretaria de Recursos Humanos equipes técnicas para trabalhar nas escolas. “Eu não determino. Eu solicito e aguardo a chegada desses servidores”. O presidente do Sindicato dos Servidores Municipais, Salatiel Hergesel, contestou a afirmação, dizendo que, segundo a Secretaria de Recursos Humanos, a contratação de novos profissionais não foi requisitada. “Precisamos apurar quem está mentindo”, disse.
Hergesel reclamou também das condições de trabalho dos funcionários. “No dia a dia, cada um aqui tem muitas histórias lamentáveis para contar das quais não há condições mínimas de trabalho. Sabe o que é dar banho em 15 a 20 crianças todo dia? Sabe o que é estar num ambiente sem o mínimo de condições de trabalho, ver um alimento e não poder se alimentar? Esses servidores da educação são heróis porque diariamente cuidam de 55 mil crianças em condições de trabalho péssimas”, concluiu.
Ao final da audiência pública, Iara Bernardi sintetizou a discordância dos vereadores participantes em relação ao projeto de gestão compartilhada: “Queremos a continuidade da rede como é, com professores e auxiliares concursados”. A vereadora também afirmou que a audiência pública dá força à secretária Marta Cassar para pressionar o prefeito a não fazer a terceirização e convocar profissionais efetivos. Por fim, Iara disse que uma nova audiência pública sobre o tema será realizada, provavelmente no dia 23 de março, para dar continuidade ao debate.