27/07/2021 11h53
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Realizada por iniciativa da vereadora Fernanda Garcia (PSOL), a terceira roda de conversa abordou o protagonismo e os desafios do feminismo negro

Dando continuidade às celebrações do Dia da Mulher Negra, comemorado anualmente em 25 de julho, a Câmara Municipal de Sorocaba realizou a “Semana da Mulher Negra, Latina e Caribenha”, com uma sequência de rodas de conversas sobre o tema, envolvendo militantes negras de diferentes áreas. Entre as discussões em pauta, foi dedicada uma roda de conversa com o tema: “Mulheres negras: vulnerabilidades, conquistas e desafios”, realizada na sexta-feira, 23. A iniciativa da semana foi da vereadora Fernanda Garcia (PSOL), autora Lei 11.812/2018, que instituiu a data no âmbito municipal. Nacionalmente, a Lei Federal 12.987 2014 criou o “Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra”, também comemorado em 25 de julho.

Mediada pela conselheira Regina Cardoso da Silva, que integra o Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Mulher, a roda de conversa sobre as vulnerabilidades, conquistas e desafios das mulheres negras contou com a participação das seguintes mulheres: Bruna Santos, chefe de gabinete da vereadora Fernanda Garcia (PSOL); Ana Júlia da Mata, do Coletivo de Psicólogas Pretas de Sorocaba; Cátia Campos, militante do Movimento Negro e Movimento da Mulher, e Elaine Cristina Santos, ativista das causas das pessoas com deficiente e integrante do Conselho Municipal das Pessoas com Deficiência.

Lembrando que o Brasil foi construído pelo trabalho da população negra transplantada compulsoriamente para o continente americano como escrava, Regina Cardoso da Silva enfatizou que as vulnerabilidades da mulher negra não são intrínsecas a ela, mas decorrentes de um sistema “racista e machista” que historicamente oprimiu os negros, ao deixar de incluí-los na sociedade após a Lei Áurea, que aboliu a escravatura em 13 de maio de 1888. Disse também que a pandemia agravou ainda mais a situação da população negra, afirmando que “os direitos conquistados no processo de redemocratização do país vêm sendo solapados pelo atual governo”.

Empreendedoras negras – Integrante da diretoria da Escola de Samba 28 de Setembro, Cátia Campos discorreu sobre o empreendedorismo da mulher negra na sociedade, destacando que o empreendedorismo parte de uma necessidade ou oportunidade e, a partir disso, busca soluções para um problema, o que leva o empreendedor a ter algumas características, notadamente, iniciativa, liderança e perseverança. “A maioria das mulheres pretas que conheço tem todas essas características”, afirma Cátia Campos, observando que a maioria das mulheres negras é constituída de “mães-solo” e chefes de família, que iniciam um negócio para sustentar a família.

Cátia Campos enfatizou que as mulheres negras foram as pioneiras do empreendedorismo no Brasil, produzindo alimentos e vendendo sua produção nas ruas. Observou que, hoje, esse espírito empreendedor da mulher negra continua presente, mas ressaltou que o empreendedorismo, ainda que não exija um diploma, não prescinde da capacitação, só que as mulheres negras, muitas vezes, não dispõem de recursos nem condições para fazer cursos e elaborar um plano de negócio e, com isso, acabam desistindo de seu empreendimento, voltando a trabalhar em serviços informais, de baixa remuneração.

Citando estatísticas sobre o empreendedorismo no Brasil, Cátia Campos disse que as mulheres negras ganham 50% menos que as mulheres brancas e os homens brancos ganham mais do que o dobro das mulheres negras. Segundo ela, com a pandemia, muitos empreendedores tiveram que recorrer a crédito pessoal para a sobrevivência de seus negócios e, nesse cenário, as mulheres negras, mesmo tendo menos inadimplência, tiveram mais dificuldade de obter crédito. Também discorreu sobre o afro-empreendedorismo, que, segundo ela, é uma forma de resistência, pois promove o comércio e o empreendedorismo entre os próprios negros para fazer frente à exclusão.

Identidade e autoestima – Integrante do Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida, Elaine Cristina Santos, que é deficiente visual, falou de sua trajetória como mulher, negra e deficiente, enfatizando que superar as barreiras exige muito esforço e posicionamento. Para ela, uma mulher negra com deficiência precisa de um respaldo ainda maior. “Eu precisei me posicionar para dizer para a cidade que eu existo e quero ter minhas lutas visualizadas”, afirmou, dizendo que, hoje, se sente muito bem resolvida, lembrando que está no último semestre de um curso superior de Gestão de Recursos Humanos. E destacou que considera a educação um caminho para mudanças inclusivas na sociedade.

A psicóloga Ana Júlia da Mata disse que “a identidade da mulher negra é construída e atravessada pelo racismo”, sendo suscetível, segundo ela, a uma série de violências ao longo da vida, como a “violência doméstica”, a “violência obstétrica”, o “celibato definitivo”, além de violências simbólicas, como a falta de representatividade nos espaços sociais e os estereótipos, como o da mãe preta, da mulata, da doméstica. Para ela, o profissional de psicologia precisa ter uma “prática clínica racializada contextualmente” para acolher a mulher e “compreender o racismo como fator de sofrimento psíquico, buscando transformar essas feridas, essas dores, em potencialidades”. Para isso, precisa desenvolver a autoestima da mulher, o que só será possível, no seu entender, resgatando a história e os aspectos positivos do negro. Caso isso, não ocorra, segundo ela, a mulher pode ser revitimizada.

A roda de conversa sobre as vulnerabilidades, desafios e conquistas da mulher negra está disponível no portal da Câmara Municipal de Sorocaba na Internet e em suas redes sociais.